No TBT de hoje, relembramos vídeo que defende e justifica a não aplicação das regras do Código de Defesa do Consumidor às relações locatícias:
Clique aqui para acessar o posto original publicado em 23/05/2013.
Recentemente fui questionado sobre a aplicação dos preceitos do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de locação. Prontamente respondi que as locações não são regidas pelo CDC. Não se contentando com uma resposta simples, questionaram-me, então, quais seriam as razões e os fundamentos.
Sem muitas discussões teóricas, é o que se passa a justificar.
De início, é bom destacar que o Código de Defesa do Consumidor foi concebido para equilibrar a relação consumidor/fornecedor, em razão da presumida hipossuficiência do consumidor em face daquele que detém o conhecimento técnico sobre o produto que produz ou o serviço que presta.
Esta hipossuficiência do consumidor não é verificada nos contratos de locação. Em geral, na locação existe um equilíbrio contratual, onde as partes podem livremente discutir e dispor os termos que pretendem pactuar. Não há uma “inferioridade técnica” por parte do locatário. Nem mesmo quando há a intermediação de uma imobiliária, por exemplo, fica evidenciada essa hipossuficiência.
Como a justificativa ainda pareceu insuficiente, prossegui.
A Lei de Locação e o CDC possuem algumas normas incompatíveis entre si e, nestes casos, apenas uma delas poderia ter incidência sobre a locação. E a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Antiga Lei de Introdução ao Código Civil) nos dá elementos para identificar qual delas deve ser aplicada.
Considerando-se que o Código de Defesa do Consumidor é temporalmente anterior à Lei de Locações, esta prevaleceria sobre aquela. O CDC, Lei 8.078, data de 11 de setembro de 1990. Já a Lei do Inquilinato, ou Lei 8.245, data de 18 de outubro de 1991.
Da mesma forma, ao analisarmos a especificidade das leis, veremos que o CDC traz normas gerais, enquanto a Lei de Locações é especial, prevalecendo sobre o CDC novamente.
O artigo 79, da Lei de Locações, determina que, “no que for omissa esta lei aplicam-se as normas do Código Civil e do Código de Processo Civil”. A lei, que é temporalmente posterior, nenhuma referência fez ao CDC, reforçando a sua não aplicação às locações.
Além disso, a relação de consumo é definida pelo CDC, que traz o conceito de consumidor e de fornecedor. A leitura do artigo 3º do CDC nos permite afirmar que o locador não se enquadra no conceito de fornecedor e, portanto, não haveria uma relação de consumo na locação. O locador não realiza quaisquer das atividades descritas pelo referido dispositivo e que poderia caracterizá-lo como fornecedor.
Outros pontos que reforçam a não aplicação do CDC decorrem justamente da referida incompatibilidade entre os seus dispositivos e algumas regras aplicáveis às locações.
A primeira dessas dificuldades surgira do confronto entre o artigo 35 da Lei de Locação e o artigo 51, XVI, do CDC.
O artigo 51, XVI, reputa abusivas e nulas as disposições que possibilitem a renúncia ao direito de indenização por benfeitorias necessárias. Já o artigo 35, permite que as partes, ao celebrar um contrato de locação, disponham que as benfeitorias não serão indenizadas.
Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça assentou entendimento de que a cláusula em que o locatário renuncia ao direito de ser indenizado pelas benfeitorias é perfeitamente válida e editou, inclusive, a Súmula 335, com o seguinte teor:
”Nos contratos de locação, é válida a cláusula de renúncia à indenização das benfeitorias e ao direito de retenção”.
Outra questão surgiria quanto à aplicação da cláusula penal moratória. O CDC, em seu artigo 52, parágrafo primeiro, limita o valor da multa a dois por cento do valor da prestação. A Lei de Locações, por sua vez, não traz esta limitação e, como se sabe, a prática costumeira é a fixação da multa em dez por cento do valor da obrigação.
Enfim, por estas breves razões, justifica-se a não aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de locação.
Informativo 0089 do STJ, de março de 2001:
LOCAÇÃO. MULTA CONTRATUAL. LIVRE DISPOSIÇÃO DAS PARTES.
A Turma deu parcial provimento ao recurso, entendendo que o Código de Defesa do Consumidor não alcança as relações locatícias por não guardar a locação, em si, uma afinidade com a atividade típica de consumo ou de prestação de serviços. Destarte, as partes podem convencionar livremente a imposição de penalidade contratual pelo descumprimento de quaisquer obrigações pactuadas; não havendo, assim, que se falar em ilegalidade na cobrança da multa moratória de 20%, estipulada no contrato. REsp 208.362-MG, Rel. Min. Vicente Leal, julgado em 20/3/2001.
Informativo 0146 do STJ, de setembro de 2002:
LOCAÇÃO. CONTRATO. CDC.
Nos contratos de locação não se aplicam as normas do Código de Defesa do Consumidor por faltar-lhes as características que delineiam as relações de consumo. Precedentes citados: REsp 212.689-SP, DJ 17/4/2000, e REsp 302.603-SP, DJ 4/6/2001. REsp 343.740-SP, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 10/9/2002.