Tal como noticiado no post datado de 28 de Fevereiro de 2013 (SATI, o que é isto – Parte 3 – clique aqui), este blog noticiou a abusividade de grandes escritórios de vendas de imóveis, que cobram o SATI (Serviço de Assessoria Técnico Imobiliária) dos adquirentes de imóveis, muitas vezes sem que nenhum serviço tenha sido prestado. Além disso, na maioria dos casos, ficou comprovado que as empresas têm obrigado os clientes a pagarem pelo SATI, quando, em verdade, deveria ser um serviço facultativo.
Pois bem.
No post anteriormente citado, noticiamos uma importante sentença, em que o Juiz de Direito, Dr. Alberto Gibin Villela, condenou a uma grande corretora a devolver, em dobro, o valor pago pelo SATI, bem como em danos morais no valor de R$ 15.000,00 (veja o teor da sentença aqui).
Após a interposição de recurso inominado por parte da empresa, a este foi dado parcial provimento, para que o SATI fosse devolvido de forma simples, bem como afastando o dano moral (veja o teor do acórdão aqui).
É curioso, contudo, verificar que o v. acórdão, considerou-se “abusiva” a cobrança realizada em face dos consumidores, sob a justificativa de ter ocorrido “venda umbilicalmente atrelada com o contrato principal” (venda casada), sem a “garantia de opção livre e consciente do consumidor” (vide ementa do v. acórdão). Também se afirmou que “as empresas atuam juntas, no mesmo espaço físico (estande de venda, v.g.) e envolvem o consumidor no momento da contratação, tolhendo-lhe a liberdade de escolha”.
Embora tenha atribuído à cobrança o adjetivo de “abusiva”, que tem natureza diversa de apenas “injustificada”, e afirmado que o contrato se revela como “mero engodo para a cobrança indevida”, ou que “o direito não se coaduna com ações ou omissões que afrontem o dever de lealdade e de boa-fé objetiva”, bem como fundamentado o v. acórdão, basicamente, na quebra do princípio da boa-fé, entendeu-se pela não aplicação do preceito contido no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, sob o fundamento de não ter sido constatada a má-fé da “construtora”.
Ora, a grande pergunta que permanece é: se a corretora não agiu de acordo com o princípio da boa-fé, como inúmeras vezes afirmado no bojo do acórdão (fls. 07 e seguintes do r. aresto), agiram de que forma? O contrário de agir em atenção à boa-fé o que seria?
Até porque a corretora é empresa especializada na compra e venda de imóveis. Sendo especializada em compra e venda de imóveis, certamente já sabe que a cobrança do SATI é indevida (basta ver as CENTANAS – repita-se, centenas de condenações em desfavor dessas empresas na Justiça do país inteiro). E por que, mesmo ciente de ser prática indevida, continua a cobrar o SATI? Ora? Não sabe que é indevido? É mesmo possível defender essa tese?
A razão pela qual continuam cobrando o SATI é simples. Em muitos casos (tais o presente), a corretora não possui nenhum prejuízo. Apenas devolve o que foi pago e alega que “desconhecia” que a conduta é abusiva. A abusividade, portanto, continua sendo lucrativa, uma vez que milhares de consumidores desconhecem a abusividade do SATI e muitos outros desistem de entrar com a ação judicial. Se o Poder Judiciário permite, por que não continuar?
Infelizmente, os Autores desse blog já sabiam que provavelmente a corajosa sentença proferida pelo Juiz de Direito Dr. Alberto Gibin Villela seria reformada. Em verdade, até mesmo o próprio Dr. Alberto já sabia disso. Quando da audiência de instrução de julgamento, após a prolação da sentença, o Dr. Alberto informou que provavelmente a sentença seria reformada, porque, muitas vezes, o “Poder Judiciário em casos semelhantes é muito permissivo”.
Enfim. Precisamos de Juízes mais corajosos, tal como o Dr. Alberto. Enquanto isso, como não há nenhum prejuízo pelas suas abusividades, conhecidas corretoras continuaram vendendo seus imóveis, cobrando SATI, e trazendo milionários prejuízos aos consumidores.
Por outro lado, milhares de consumidores perdem a confiança no Judiciário (basta ver os dados corriqueiramente manifestados na imprensa), servindo como um grande convite às abusividades das empresas.
Concordo com o raciocínio do Dr. Villela, porém entendo que, a fim de que se possa reformar esse entendimento do Tribunal (que não se coaduna com nenhuma* doutrina de direito do consumidor)não devemos nos prender à argumentação da existência, ou não, de má-fé.
(até porque a má-fé é evidente, e os senhores também me parecem partilhar desse entendimento)
A questão é: em que momento a legislação consumerista, que foca a responsabilidade dos fornecedores na objetividade, em regra, justamente por serem hiperssuficientes, previu como requisito para a incidência da sanção do Artigo 42, parágrafo único, do CDC, a má-fé?
Esta é justamente a crítica da Cláudia Lima Marques à jurisprudência.
O Artigo 42, parágrafo único não fala em má-fé e sim em escusabilidade do erro (que também não se encontra presente no caso da taxa SATI, é de conhecimento de todos a ilegalidade de sua cobrança).
Juntando-se a ausência desse requisito e os princípios do macrossistema consumerista, temos que a jurisprudência não está seguindo uma posição doutrinária (ou jurisprudencial) que entende ser adequada.
Está, verdadeiramente, atuando contra legem! Pois estão exigindo um requisito que não existe para aplicação da lei (neste caso)!
Esta é a minha visão.
De qualquer forma, precisamos, por certo, de Juízes mais corajosos, que não se atenham à jurisprudência como se esta fosse imutável. O Direito não pode ser engessado.