Nos contratos entre particulares predomina a chamada “autonomia da vontade”. As partes podem pactuar o que for de seu interesse. E o limite desse interesse será a própria imaginação dos contratantes, “desde que não sejam violadas a ordem pública e a função social do contrato” [1]. Ou seja, “os particulares, dentro dos limites legais, poderão criar as figuras contratuais que necessitarem no mundo dos negócios” [2].
Porém, algumas formas de contrato, seja porque são mais corriqueiras entre nós, seja porque possuem um interesse social maior, sofrem algumas restrições e possuem diretrizes comuns fixadas pela lei. Ou seja, a própria lei acaba por regulamentar uma determinada espécie de contrato, sinalizando determinados pontos do instrumento que será celebrado.
Surge aí a classificação dos contratos em “nominados ou típicos” e “inominados ou atípicos”.
Nominados “são aqueles contratos especificamente regulados por um texto legislativo, que possuem denominação legal e própria” [3]. Nestes, “as partes podem disciplinar os pontos essenciais do contrato, já que os pontos secundários são regulados por uma disposição do texto legislativo especialmente aplicável a este contrato” [4].
Já “os contratos inominados ou atípicos afastam-se dos modelos legais, pois não são disciplinados ou regulados expressamente pelo Código Civil ou por lei extravagante” [5].
Pois bem, um contrato que ganhou importância nos últimos anos, deixou de ser “inominado” e passou a ter previsão expressa em lei, com a promulgação da Lei 12.744/2012, foi a locação nos contratos de construção ajustada, ou, usualmente chamado de “built to suit”.
Nessa espécie de contrato de locação de longo prazo, o locador adquire um imóvel e nele constrói um prédio que atenda especificações e necessidades do locatário. Ou seja, o locador se compromete a construir u reformar um prédio visando atender aos interesses do locatário, nos termos previamente ajustados no próprio contrato de locação.
O proprietário faz um investimento de grande vulto para construir o prédio, visando o retorno que terá com o pagamento dos alugueres. Por isso, esta espécie de contrato é sempre firmado por prazo determinado, com longa duração, pelo tempo necessário para que o proprietário-locador possa amortizar os investimentos realizados.
Assim, com a promulgação da referida lei, alguns dispositivos foram inseridos na Lei de Locações (Lei 8.245/91), que passou a regular expressamente a modalidade de locação do “built to suit”, ou, de construção ajustada.
Inseriu-se na a Lei 8.245/91 o artigo 54-A, que assim “conceituou” esta espécie de locação:
Art. 54-A: Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado, prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições procedimentais previstas nesta Lei.
Tratando-se de modalidade de locação um pouco diferente pois, como visto, além da locação, há a construção ou reforma prévia de um prédio, de acordo com as especificações do locatário, algumas regras gerais sobre locação precisaram ser adaptadas a este tipo de contrato.
É o caso, por exemplo, do disposto no parágrafo 2º, do referido artigo, que ensejou, inclusive, a alteração do teor do artigo 4º da Lei de Locação.
Com efeito, a regra geral prevista no artigo 4º determina que o locatário pode devolver o imóvel locado durante o prazo estipulado para a duração do contrato de locação, desde que pague a multa pactuada, proporcionalmente ao período de cumprimento do contrato.
Ou seja, se o locatário devolve o imóvel antes do prazo previsto no contrato, deve pagar a multa contratual, mas não em sua integralidade. A multa será reduzida de acordo com o tempo de cumprimento do contrato, de forma proporcional.
Essa é a regra geral, mas que não se aplica para a locação nos contratos de construção ajustada.
Nessa espécie de contrato, prevê o parágrafo 2º, a multa deve ser suportada pelo locatário, até o limite da soma dos alugueres que pagaria até o final do contrato:
§ 2º: Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se esta a cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber até o termo final da locação.
Em outras palavras, a multa deverá ser paga integralmente pelo locatário que devolver o imóvel antes do prazo, respeitando uma única e lógica limitação: que o valor da multa não seja superior ao valor que o locatário pagaria ao locador caso cumprisse o contrato até o seu prazo final.
Cumpre destacar que, mesmo havendo previsão legal sobre esta espécie de contrato (passou a ser um contrato nominado), a lei não se aprofunda no tema e não traz diretrizes sobre como devem ser tratados todos os pontos que envolvem um contrato complexo como este. Assim, e nem poderia ser diferente, não há impedimento para que as partes estipulem as cláusulas que entendam necessárias para a celebração de contratos de “built to suit”, como se de “contrato inominado” se tratasse, conforme se verifica do disposto no artigo 54-A, acima transcrito.
Clique aqui para ver o Texto Original e Justificação da Lei 12.744/12.
Clique aqui para ver o Texto Aprovado da Lei 12.744/12.
Clique aqui para ver o Texto do Veto ao Parágrafo 3º do Artigo 54-A da Lei 12744/12.
[1] LOUREIRO, Luis Guilherme, Contratos, Teoria Geral e Contratos em Espécie, 3ª Edição, Editora Método, 2008, p. 148.
[2] DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro, 3º Volume, 18ª Edição, Editora Saraiva, 2003, p. 94.
[3] Idem, p. 147.
[4] Ibidem.
[5] Idem.